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BLOG PEF 2021 Por André Teixeira

BATE-PAPO COM MONICA ZARATTINI

Você tem uma vasta formação acadêmica, em áreas como a História e as Artes. Por que a escolha da fotografia como profissão?

   Na verdade, a fotografia me escolheu na adolescência, quando fiz meu primeiro curso de fotografia, aos 16 anos, e depois de entrar no laboratório e no quarto escuro, nunca mais saí de lá...Cursei história na USP, me formei, dei aulas de história e voltei a trabalhar com fotografia no fotojornalismo, que é também uma forma de estar na história do dia a dia e contemporânea. Contar histórias por meio de imagens. 

 

Como essa formação se reflete na sua fotografia, tanto atrás da câmera quanto como editora?  

    Não há como ser um bom fotojornalista sem informação. O estudo, a leitura, a atualização, tudo isso é fundamental para traduzir em boas imagens uma notícia. Não basta ter a formação técnica. É preciso saber aliar as duas. No campo da edição, posso dizer o mesmo. É preciso estar bem informado para saber quais são as imagens que devem ser escolhidas e publicadas. No meu dia a dia de editora, em um jornal diário como O Estado de S. Paulo, olhava por dia de três a cinco mil fotografias e vídeos. Impossível selecionar e editar se não estivesse extremamente bem informada.

O mesmo posso falar na via contrária. Foi por conta da minha experiência no dia a dia que desenvolvi minha tese de mestrado, em que tive como hipótese a função informativa da legenda da fotografia. Ao constatar como o texto se associava pessimamente à imagem numa página de jornal, resolvi pesquisar sobre a relação legenda/fotografia.

Sua tese de doutorado é sobre o Paraty em Foco. Qual é a importância dos festivais na formação de profissionais e de um “público consumidor” de fotografia? 

    O papel dos festivais na formação não só dos profissionais, mas também dos amantes da fotografia e da imagem em geral, é fundamental pelo encontro que realiza entre pessoas. Num festival há inúmeras atividades que atraem o público, seja nos festivais presenciais, seja nos online, realizados em novas plataformas devido à pandemia. Esse leque de opções que são postas num festival, como entrevistas, debates, oficinas, leituras de portfólios, performances, projeções e exposições, atrai um público diverso para um encontro ímpar. É nessa convergência de interesses que se dão as melhores trocas de saberes e de culturas. Essa riqueza é o que o beneficia o público consumidor de fotografia. 

Foi por esse motivo que resolvi estudar o maior festival de fotografia brasileiro, o Paraty em Foco. Acredito que essas quase duas décadas de  existência conferem ao Paraty em Foco uma amostragem do que há de melhor na fotografia contemporânea do início do século XXI, por isso sua importância para o segmento cultural e para o campo da fotografia. Estudar o festival  e poder contar sua história foi antes de tudo um prazer.

 

Como editora, você acompanha a produção fotográfica brasileira e internacional. Que nomes no Brasil destacaria? Como vê o nível de nossa produção, diante dos trabalhos realizados em outros países?

    No plano internacional, destacaria o fotógrafo dinamarquês Mads Nissen, vencedor do World Press Photo 2021. O curioso é que ele ganhou o prêmio como uma imagem feita aqui no Brasil de uma idosa sendo abraçada por uma “ cortina de plástico” inventada para possibilitar o contato perdido com seus familiares na pandemia. Uma imagem simples porém carregada de informação e poesia. 

No Brasil, destaco no plano do fotojornalismo, dois fotógrafos que atuam em Brasília. O veterano Sergio Lima, que tem feito excelente cobertura do desgoverno que se instalou no Brasil - basta lembrar a fotografia que fez do ministro da Saúde Pazuello com a máscara no meio do nariz - e a jovem Gabriela Biló, que tem inovado trazendo ao público por intermédio do Instagram uma série de storiese reels em que com muita criatividade mostra os bastidores da cobertura jornalística no campo da política. Ambos usam a imagem como forma de crítica e reflexão.

Atualmente, uma das discussões em pauta mundo afora é a participação feminina no mercado de trabalho, tanto em questão de espaço quanto de remuneração. Como foi, ou é, sua experiência em relação a isso? 

   Infelizmente ainda vemos no mercado de trabalho mais homens e mais brancos. Repare quando as vezes o Jornal Nacional faz algum “minuto de silêncio” e mostra a redação deles, sempre há mais homens do que mulheres. Na minha geração é que o mercado se abriu para mulheres fotógrafas. Olhe também para os júris, muitas vezes de maioria masculina, assim como os premiados. Nossa luta é constante para que o mercado aceite mais mulheres, pretos e lgbtsqia+ e celebre a diversidade. Todos ganham com isso.

Vê uma evolução nesse sentido? O que ainda pode e deve evoluir, e como chegar a isso?

    Sim, vejo uma evolução de quando comecei, inicio dos anos 80. Mas, de fato, temos ainda muita caminhada para que todos estejam representados. Uma das soluções é colocar mais mulheres em cargos de chefia. 

 

Os maiores jornais brasileiros vêm reduzindo suas equipes de fotografia, utilizando cada vez mais fotos de agências e até de leitores. Além do reflexo no mercado de trabalho, qual é o impacto desse movimento na qualidade dos jornais, na própria oferta de informações e pontos de vista diferentes?

   Toda vez que os jornais reduzem seus quadros profissionais, pode ter certeza que quem perde é o leitor. Quando uma informação não é checada ou uma fotografia tem procedência incerta o produto final estará com qualidade ruim. Infelizmente, os veículos solucionam suas crises cortando no que é a “alma do negócio”, no caso o repórter ou o fotógrafo. É como um hospital sem médicos e enfermeiros, lamentável.

Um de seus trabalhos mais recentes é o fotolivro “Plano, seco e pontiagudo”, realizado na região da Guerra de Canudos, um dos momentos mais sangrentos da História brasileira. O que move sua fotografia? É possível mudar o mundo através da imagem?

    Não só diria que é possível mudar o mundo por meio de imagens, mas principalmente que o mundo está sendo mudado pelas imagens, independente do nosso desejo. Vivemos a era das telas. Estamos cercados de imagens. 

Resgatar a história do Brasil no meu fotolivro foi uma maneira de refletir sobre o que mudou ou não em um cenário de guerra como foi o de Canudos no final do século XIX. As questões culturais, sociais, religiosas e políticas estão postas nas imagens do livro e perpassam pelos seus personagens. O que move minha fotografia é o ser humano e suas necessidades para uma vida digna e mais justa. 

Tem conseguido produzir durante a pandemia? Que projetos vem desenvol-vendo? Teve que interromper ou adaptar algum deles por causa da Covid?

  Pessoalmente e de forma autoral não investi em projetos, mas coletivamente sim. Fui idealizadora e curadora da 20 X 20 Galeria Solidária de Fotografia, projeto lindo que ajudou financeiramente muitos colegas na pandemia em 2020 e em 2021 fui curadora do Festival de Imagens Periféricas, onde trocamos muitos saberes com jovens fotógrafos da periferia e/ou que nela atuam, trazendo o que há de melhor na fotografia brasileira.

Você é uma das convidadas do PEF 2021, cujo tema é “Fotografia Solidária”. Como será sua participação no Festival, e o que espera ver entre os trabalhos expostos?  

   Sempre esperamos o novo e com o tema “Fotografia Solidária”, acredito que muitos artistas se moveram para processos criativos talvez menos convencionais, devido às limitações que nos foram impostas pela pandemia. Muitas poéticas podem ter sido criadas de maneira inusitada…Vamos conferir, que venha logo nosso 17º PEF!

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