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BLOG PEF 2021 Por André Teixeira

BATE-PAPO COM ANTONELLO VENERI

Você é formado em Literatura e História Italiana. Por que a opção pela fotografia como profissão?

      Durante a faculdade comecei a trabalhar numa revista da minha cidade, QuestoTrentino. A revista fazia, e ainda faz, muito jornalismo investigativo mas eu comecei escrevendo sobre música, teatro e cultura. Às vezes, nos meus artigos, precisava de fotos, e comecei a fotografar. Aos poucos, fotografei sempre mais e escrevi sempre menos. Ainda gosto de escrever artigos, acho que até me saio bem, mas minha praia é fotografar.

Você está desde 2009 no Brasil. O que te trouxe ao país? Em que cidades morou?

        Percebi que preciso de círculos ou percursos com uma duração de mais ou menos 10 anos na minha vida. Intensos, radicais e ricos de novidades e conhecimentos. Quis me mudar pro Brasil porque queria mergulhar numa outra cultura. O percurso brasileiro, depois de 12 anos, está chegando ao fim.

Morei em Salvador, São Paulo, Fortaleza e Complexo da Maré, no Rio de Janeiro. A cada ano, dependendo do trabalho, circulo por estes lugares, cheios de amigos e histórias para contar. O que me move é a curiosidade. A curiosidade, através da fotografia e do vídeo, se tornou o meu ganha-pão. Sou um curioso profissional.

Seu trabalho é documental, fortemente voltado para as questões sociais, para as periferias. Qual é o mercado para este tipo de fotografia? Você trabalha por demanda ou cria as próprias pautas e as oferece?

        Meu trabalho é contar historias. Não necessariamente envolve periferias. A comunidade da Ladeira da Preguiça, em Salvador, fica no Centro Antigo e o Mucuripe, em Fortaleza, onde fotografo os jangadeiros, fica na beira-mar. Digamos que gosto de contar as historias de comunidades de pessoas, no sentido amplo da palavra. Agora, por exemplo, estou gravando um vídeo-documentário no sertão do Ceará. Acho bem interessante documentar as interações, as dinâmicas, os contrastes destas comunidades que resistem dentro de um contexto muitas vezes cruel e injusto, socialm e economicamente.

Trabalho para revistas e jornais, para ONGs e instituições, para agências de notícias, mas hoje em dia é muito raro alguém pautar uma matéria completa. Geralmente sou eu que faço a proposta de pauta. É um problema complexo. O fotojornalismo e a fotografia documental são vivos e ativos, mas há um número impressionante de pessoas fazendo isso. Ou achando que estão fazendo isso. E sempre menos dinheiro para quem trabalha nesta área.

Este é um tema que atrai muitos fotógrafos. Como se destacar em meio a tantas imagens, tantos trabalhos de ótima qualidade?

        Tem que ter a atitude do Ulisses de Dante na Divina Comedia. O Ulisses arde de curiosidade, literalmente. E por isso fica no inferno. Mas a fala dele para os marinheiros vale uma vida ”Fatti non foste a viver come bruti, ma per seguir virtute e canoscenza”. Traduzindo: “vocês não foram feitos para viver como brutos, mas para seguir a virtude e o conhecimento”.

Na QuestoTrentino, você também escrevia as próprias matérias. Continua trabalhando dessa forma? Isso aumenta a aceitação de seus trabalhos no

mercado editorial?

       Na outra resposta falei do Ulisses e de arder pelo conhecimento. Isso é ótimo, mas  na pratica é preciso também saber ser “multitasking”,ou multifunção. Então, para este mercado de trabalho, além de fotografar, saber escrever e especialmente gravar vídeos ajuda muito e amplia as possibilidades profissionais.

Você acompanha o trabalho dos fotodocumentaristas brasileiros?

Que nomes destacaria?

       Em relação à obra completa, duas fotógrafas, a Claudia Andujar e MaureenBisilliat produziram o melhor da fotografia brasileira. Sem dúvida. As fotos dos Yanomami e do sertão nordestino me emocionam. Entre os ensaios individuais destacaria o trabalho no bairro do Maciel, no Pelourinho, em Salvador do Miguel Rio Branco, e o da Serra Pelada, do Sebastião Salgado. Bauer Sá é o melhor retratista brasileiro.  Na fotografia documental, há nomes excelentes. Penso logo no Lalo de Almeida, no Raphael Alvez e na Ana Carolina Fernandes.

Nestes mais de 10 anos de Brasil, acompanhando de perto essas periferias e sua população, você vê uma mudança nesse quadro de pobreza e injustiça?

       Houveram algumas mudanças. É evidente. Mas avançar dois passos e retroceder um é frustrante. Nestes 12 anos de Brasil conheci e amei um país incrível, mas com uma falta de confiança nas instituições assustadora. A causa disso tem que ser buscada nas mesmas instituições: política, segurança,saúde, escola, burocracia.

Como a fotografia pode ajudar a reverter essa situação,

ou pelo menos colaborar para uma melhora, ainda que pontual?

        A fotografia documental não vai mudar o mundo ma pode ser um convite à reflexão. Quem quer refletir pode mudar o mundo.

Tem conseguido produzir durante a pandemia? Que projetos vemdesen-volvendo? Teve que interromper ou adaptar algum deles por causa da Covid?

Durante a pandemia parou, ou se interrompeu, quase tudo o que não era relacionado com a pandemia. Mas eu fiz exatamente o que fazia antes, continuei a ficar na rua para documentar, com máscara e álcool gel.

Em março de 2020, comecei um grande projeto sobre os trabalhadores essenciais e informais na pandemia. Já foi publicado em vários jornais e revistas. Agora estou finalizando um documentário sobre o sertão e vou começar um trabalho sobre refugiados venezuelanos ao redor do Brasil.

Você é um dos convidados do PEF 2021, cujo tema é “Fotografia Solidária”.

O que pretende mostrar no Festival, e o que espera ver entre os

outros trabalhos?

Queria mostrar como a fotografia precisa de um retorno humano, de uma relação mais próxima entre fotógrafo e fotografado. Muitas vezes entramos nas vidas das pessoas fotografadas e saímos rápido. É importante manter viva a relação com quem fotografamos. Algumas das minhas fotografias tiveram até um impacto pratico, positivo, na vida das pessoas que fotografei. E uma das coisas que me orgulham mais nestes anos de Brasil é ter feito muitas exposições fotográficas fora das galerias e museus, mas nos lugares onde fotografei, com as e os fotografados participando ativamente.

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