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BATE-PAPO PEF 2023 Por André Teixeira

BATE-PAPO COM MIRIAM RAMALHO

Formada em Artes Plásticas e Letras, Míriam Ramalho passou a dedicar-se integralmente à fotografia depois de se aposentar. Desde então, vem participando de expedições fotográficas no Brasil e no exterior. As viagens já renderam livros, exposições e prêmios, inclusive o de melhor Ensaio no Paraty em Foco, do qual será uma das convidadas neste ano. Nesta entrevista, ela fala sobre seu trabalho e da expectativa para o festival.

Como surgiu sua relação com a fotografia?

A fotografia sempre esteve presente na minha vida familiar. Meu pai gostava de registrar todas as etapas de crescimento dos filhos. Tenho até hoje o álbum “Minha Filha", que ele fez com capa de couro, papel de seda e cantoneiras acolhendo as fotos que fazia desde o meu nascimento. Seguindo seus passos, sempre fotografei meus filhos e continuo agora registrando o crescimento dos netos.

Fale um pouco sobre sua trajetória. Como aprendeu, o que gosta mais de fotografar, exposições, livros...

Minha formação começou no Instituto de Educação, onde fiz o Normal e me formei professora primária. No ano de prestar vestibular, acabei fazendo concurso para professora do município do Rio de Janeiro, para o Banco do Brasil e para a Escola de Belas Artes da UFRJ. Passei nos três concursos e protelei a entrada no BB porque gostava de ser professora. Contudo, o salário e as vantagens do Banco um dia prevaleceram e acabei passando 28 anos dentro da instituição. Quando me aposentei, resolvi participar de expedições fotográficas. A ideia de aprender a fotografar viajando me atraía. Passei por vários países com fotógrafos conceituados, e a cada viagem eu aprendia algo novo.

Com o tempo, percebi que gostava de fotografar pessoas, me interessava cada vez mais pela diversidade, pelos povos e sua cultura. Descobrindo locais como Benin, Etiópia, Vietnã, Mianmar, China, Guatemala e outros,  fui ficando cada vez mais atraída pelo ser humano.

 

A África me sensibilizou especialmente pela semelhança com o Brasil, que senti ao visitar o Benin. Morei 19 anos na Bahia e chegando àquele país, me senti em casa. Desta viagem saiu meu primeiro livro em 2020: BENIN. Dois anos depois, com vasto material da viagem à Etiópia acabei fazendo o segundo livro: ETIÓPIA. Ambos foram editados e impressos pela Editora Origem.

 

Em 2017 passei a fazer parte do RioFotográfico, fotoclube do Rio de Janeiro, e o estímulo que recebi do seu presidente, Roberto Soares-Gomes, foi fundamental para que eu começasse a participar de concursos de fotografia. A partir daí minha fotografia foi ficando mais conhecida. Ganhei prêmios importantes como o primeiro lugar de Ensaio no Paraty em Foco 2022, o primeiro lugar de foto destacada na Revista Fotografe Melhor em 2021 e menções na Revista Francesa PHOTO em 2021 e 2022. As exposições também começaram a surgir. Participei de várias coletivas inclusive no exterior.

Você vem desenvolvendo dois projetos pessoais: “Garimpando" e “Casa do Careca”. Do que se tratam?

“Garimpando” é um projeto com a Cooperativa Quitungo (lixo reciclável) em Brás de Pina, subúrbio do Rio de Janeiro. Este ensaio já foi premiado pela Revista Fotografe Melhor. “Casa do Careca” é um projeto em que acompanho um morador de rua que vive no Jardim de Alah, em Ipanema, no Rio de Janeiro. A meta, além do trabalho fotográfico que já resultou num foto-filme que participou de mostras, é que ele consiga a casa, seu sonho antigo.

Entre suas muitas viagens para fotografar, qual te impactou mais, visualmente falando?

A Etiópia. No país há em torno de 80 etnias com culturas e línguas próprias. O Vale do Omo é o lugar onde mais as encontramos. Visitamos algumas e perceber suas diferenças e a beleza das suas tradições me fizeram entender o quanto o mundo é rico em diversidade e que há muito o que aprender com ela.

Quais são suas maiores referências na fotografia?

Tenho muitas já que à medida que aprendia a fotografar fui conhecendo fotógrafos e suas obras. Elliot Erwitt foi o primeiro e aí seguem alguns grandes fotógrafos da Magnum: Steve McCurry, Cartier Bresson, Martin Parr, Eugene Smith.

 

Os fotógrafos brasileiros tiveram também uma importância grande no desenvolvimento do meu olhar. Entre eles estão os fotógrafos que me conduziram nas expedições fotográficas: Fábio Elias, Marcelo Portella, Haroldo Castro, Valdemir Cunha e Reinaldo Hingel.

 

Outros brasileiros como Walter Firmo, Evandro Teixeira, Claudia Andujar, Rogério Reis, João Roberto Ripper e outros da nova geração de fotógrafos, como Ratão Diniz, tiveram e ainda têm especial importância na minha formação como fotógrafa.

Neste ano, o Paraty em Foco vai abordar a questão da Inteligência Artificial na fotografia. Você tem acompanhado esse assunto? O que acha das imagens criadas com este sistema?

Participei este ano de um projeto usando Inteligência Artificial num grupo conduzido pelo Eder Chiodetto. Não conhecia nada sobre o assunto, mas com a ajuda do Milton Montenegro e de colegas do grupo consegui produzir fotos no Midjourney, um dos sites de produção de imagem IA. O trabalho gerou um e-book e deve estar pronto ainda neste semestre. Foi muito interessante a experiência.

Acho que as imagens criadas a partir de sites que usam a Inteligência Artificial podem ter diversas aplicações e produzir trabalhos de valor artístico, estético e comercial ilimitados. Tudo o que é novo causa impacto e uma certa resistência, mas acredito que este é mais um recurso, uma ferramenta para nos expressarmos e criarmos algo que some ao acervo das produções humanas.

O festival também vai tratar da fotografia analógica, que vem recuperando espaço depois da explosão das câmeras digitais. Como vê esse regate?

Que diferenças há entre a foto analógica e a digital?

Não gosto de excluir nada. Sou a favor da liberdade de expressão através das diversas ferramentas. Se alguém se interessa pela fotografia analógica que vá em frente na sua pesquisa, na sua busca, da forma que se sinta motivado a criar. O coração muitas vezes dá a direção.

 

A diferença entre a foto analógica e a digital é apenas técnica, o que conta é o que se vai fazer com uma e ou com a outra. Qualquer ferramenta que se use para criar algo deve estar a serviço de uma idéia, um propósito, um assunto, algo que o fotógrafo quer dizer, quer expressar.

Vivemos numa época dominada pelas imagens, com bilhões de pessoas pelo mundo com uma câmera na mão, prontas para fotografar e publicar em redes sociais. Como se destacar nesse panorama? O que diferencia uma boa foto de um registro banal?

Acho a democratização da imagem de grande importância. Qualquer pessoa hoje pode registrar um fato, seja ele parte de sua rotina, seja um selfie, uma viagem ou até mesmo um assassinato. Abrindo o ângulo do entendimento da imagem, vejo que ela tem muito poder na sociedade contemporânea. Ela pode contribuir de várias formas, seja na solução de problemas, denúncias, conhecimento, informação, seja no registro histórico de uma época da humanidade.

 

Pensando na fotografia como arte, como forma de expressão, acho que aí sim há uma diferença importante e que destacará fotógrafos e artistas que tenham o que dizer e contribuir com o pensar e o sentir através das imagens.

Você costuma participar de festivais de fotografia? Qual a importância deste tipo de evento na formação de novos fotógrafos e de um público consumidor desta arte?

Acho os festivais fundamentais para todo tipo de trocas. O clima festivo com a presença de fotógrafos, expositores, palestrantes, etc cria um ambiente estimulante para quem está começando e também para aqueles que já estão há tempos na estrada. É bom para todo mundo porque sempre se aprende algo novo.

Qual sua expectativa para a edição 2023 do Paraty em Foco?

São as melhores. Adoro ir ao Paraty em Foco e cada ano que passa conheço novas pessoas e vejo novos trabalhos. Além, claro, de aprender com palestrantes de várias áreas da fotografia. Dos festivais a gente sempre leva uma nova motivação e sai com energia renovada.

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